Artigo: Escola pública integral

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“… se não for como eu quero, quebro o brinquedo…”

Por: Dr. Luiz Roberto Vasconcellos Boselli*

As sociedades humanas apenas conseguem alterar e melhorar os arraigados valores sócio/econômico de sua realidade cultural quando o Sistema Educacional assume o protagonismo de ações educacionais inovadoras. Evidentemente que esta possibilidade somente ocorre em uma Democracia e em um Estado de Direito e, tendo um Governo Central assaz arejado.

A pós-modernidade atual engendra um momento histórico singular: a Escola Pública Integral, laica e, mesmo que tenha o seu livre-arbítrio limitado localmente, tem condições e pode desencadear um consistente processo coletivo de transição do paradigma cartesiano para o paradigma holístico. A labuta educativa é ação reflexiva e reflexão ativa. Ambiente multitemático, isento de dogmatismos religiosos e sectarismos políticos, mas que tenha um cotidiano, como um lugar comum, onde prevaleça o respeito total e irrestrito ao pluralismo de raça, de cor, de gênero, de credos religiosos, de opções políticas e culturais. Podendo estabelecer, em sua cultura holística local, a palavra que será o âmago de todo o processo de transição: TOLERÂNCIA. Ambiente que proporcione possibilidades de que o alunato desenvolva a postura de sujeito de suas escolhas acadêmicas.  Vivenciando, o conhecimento científico de todas as ciências, inserido em um dinamismo da transdisciplinaridade: o prefixo “trans” indica, diz respeito àquilo que está ao mesmo tempo entre as disciplinas, através das diferentes disciplinas e além de qualquer disciplina. Seu objetivo é a compreensão do mundo presente para o qual um dos imperativos é a unidade de todos os constructos do conhecimentohumano que abarca todas as áreas de ciências em um dinâmico ambiente holístico.

A disciplinaridade a pluridisciplinaridade, a interdisciplinaridade e a transdisciplinaridade são as quatro flechas de um único e mesmo arco: o do Conhecimento. (Basarab Nicolescu). O desencadear deste processo gera mudanças que contribuirão efetivamente para que o alunato elabore e incorpore esta maneira de ser e de estar no mundo. Processo que solidifica, em sua pessoa humana, como ser totalizado, em sua plenitude existencial (bio/psico/social) – um ser humano gregário, do mundo e para o mundo, inserido e atuante em seu universo comunitário. (Unesco/1993 – Comissão Internacional sobre Educação para o século XXI) “Quatro pilares de um novo tipo de Educação: 1) Aprender a Conhecer; 2) Aprender a Fazer; 3) Aprender a Viver Junto; 4) Aprender a Fazer.

Uma Escola Pública Integral tem que necessariamente e imprescindivelmente funcionar com um dinamismo propositivo pleno. Assim poderá cumprir com uma das suas importantes razões de ser – contribuir efetivamente para a formação de cidadãs e cidadãos cônscios de suas escolhas, e satisfatoriamente capacitados para entrar no mercado de trabalho ou continuar seus estudos, mas sobretudo, a consciência de que  já faz parte de um Estado de Direito e Regime Democrático, e como todos do povaréu brasileiro, concidadãos, tem o direito de experienciar uma vida repleta de conquistas e de satisfações positivas  no plano pessoal e profissional. A Escola Pública forma civis cidadãos e cidadãs, a Escola Militar forma militares cidadãos e cidadãs. Ambas devem contribuir significadamente e concretamente com a formação do caráter citadino de seus estudantes, como cidadãos cônscios dos eixos éticos e existenciais da cidadania: saber – ciente do contexto do aqui agora; dever – consciência de deveres e direitos; querer – motivações pessoais e profissionais; fazer – atuar cooperativamente como sujeito de suas ações, porém, preservando sua individualidade e sua singularidade. Todos os temas oriundos de conflitos interpessoais devem ser mote de atividades reflexivas, e, não, serem tratados apenas e tão somente do ponto de vista administrativo.

É imperativo que todas as ocorrências de conflitos interpessoais que ocorram, em razão de injúrias, intolerância, desrespeito em razão de gêneros, agressões físicas e psicológicas e outras ordens de variáveis oriundas da preconceituosa ignorância, podem e devem ser tematizados para discussões em grupo utilizando estratégias de: reflexões e teatralização; “audiência pública”, “debate”, “fórum”, “proposta de candidatos com pensares antagônicos” e outras tantas que tenham a mesma razão de ser – ações que contribuirão efetivamente para que todos os participantes/envolvidos consolidem o nobre sentimento humano – a corresponsabilidade.Basta de estigmatização, basta de saberes fragmentados, basta de pedagogia depositária, e basta da pedagogia do medo!“Ao término de um período de decadência sobrevêm o ponto de mutação. A luz poderosa que fora banida ressurge. Há movimento, mas este não é gerado pela força… O movimento é natural, surge espontaneamente. Por essa razão, a transformação do antigo torna-se fácil. O velho é descartado, e o novo ê introduzido. Ambas as medidas se harmonizam com o tempo, não resultando daí, portanto, nenhum dano. (I Ching)” Refletir acerca de mudanças, muitas vezes, a realidade que sufoca, leva aos pensamentos proibitivos de que é impossível. Fato é que fácil também não o é.

Entretanto, é mais que necessário sacudir o julgo iniciando um processo que rompa a inércia da roda. Assim favorecemos o retorno de valores culturais do sistema idealístico que representa a combinação harmoniosa e tende alcançar as mais e nobres expressões, produzindo equilíbrio, integração e plena realização estética em arte, filosofia, ciência e tecnologia. Este sistema idealístico, com benemerentes valores culturais, irá se sobrepor ao nefasto panorama que vivemos e que vem tampando grande parte do nosso azul céu anil, um obscurantismo hostil, autoritário, belicoso, intolerante, falacioso, anacrônico e embusteiro que está criando hipocritamente um clima de intranquilidade político/cultural.Estamos voltando a ter esperança de que tempos ensolarados se formem e perenizem.

Que os raios fúlgidos do sol da liberdade afugentem o obscurantismo doutrinariamente dogmático. E que a Escola Pública retome o seu protagonismo e cumpra a sua histórica missão e seu propósito sagrado: formar seres humanos, ministrando saberes científicos consagrados através dos tempos e sempre agregando saberes no futuro. Escola Pública: o Centro Cultural laico que alumia uma comunidade.

*Dr. Luiz Roberto Vasconcellos Boselli é docente da Unesp/Marília –  [email protected]

**Os artigos assinados não representam a opinião de O Defensor!

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